quarta-feira, 5 de junho de 2013

Por que as cenas de violência são tão populares? Elas fazem bem ou mal?


Quantas horas você e sua família passam em frente à tevê?
Embora seja usada como babá eletrônica, 
a TV pode 
ser muito nociva à formação dos seus filhos

"Quase todas as pessoas concordam que é condenável ferir ou matar outras pessoas. Em todas as sociedades o assassinato é considerado um crime hediondo, recebendo as penas mais drásticas. Por que, então, as cenas que representam tais atos são populares a ponto de serem apresentadas constantemente?

Para chegar a respostas é necessário, em primeiro lugar, observar claramente os fatores que fizeram dos meios visuais os meios de comunicação de massa. Ao examinar essa questão, conclui-se que a mídia preenche determinada função junto à massa espectadora. Ela deve libertar o espectador de determinados sentimentos relacionados ao cotidiano, substituindo-os por vivências agradáveis. Quem vai ao cinema, por exemplo, está superficialmente interessado no filme em exibição (excetuando-se os cineastas). O que interessa ao grande público, em primeiro lugar, é o efeito que o filme causa na alma. Ele deve suprimir sentimentos desagradáveis e substituí-los por agradáveis.

Anteriormente à mídia visual, outro tipo de mídia - como o romance trivial, por exemplo - preenchia essa tarefa. Em poucos anos, contudo, a mídia visual superou o livro. Isso se deve ao fato de o filme (o termo 'filme é usado aqui como representante dos meios audiovisuais), sem exigir atividade própria, provocar efeitos mais intensivo do que o livro. Essa tecnologia oferece a possibilidade de penetrar numa espécie de sonho e compartilhar do enredo apresentado numa superfície de projeção. À medida que isso acontece, o espectador pode abandonar a própria realidade, juntamente com os sentimentos desagradáveis. Com isso surge o paradoxo de um compartilhar sem participar.

Por que - e essa é a questão - as cenas de violência atraem o espectador? As razões são várias. Primeiramente, deve-se atentar ao fato de que observar violência contra seres humanos provoca fortes emoções. Uma pessoa com uma cabeça sangrando aciona espontaneamente sentimentos de consternação. O espectador sabe, sem ter de pensar sobre o que está vendo, o que significa esse ferimento. O filme produz, com isso, um efeito no sentido de distrair a atenção com um mínimo de desempenho intelectual.
O conteúdo com violência desperta sensação de alerta
contra situações e pessoas. Ou seja, potencializa o medo,

a insegurança, a violência



Entre as emoções perturbadoras, existe uma que na maioria das pessoas é difícil de reprimir: o medo. Um filme em que o pior imaginável acontece a outra pessoa oferece ao espectador a possibilidade de projetar o próprio medo nos acontecimentos da tela. Ele não se liberta de seus medos, mas estes não o atingem mais porque ele está temendo por outra pessoa.

Cenas de crueldade cometida contra outras pessoas podem também estar relacionadas com o seguinte: - Uma pesquisa realizada com jovens, e que tratava das causas da preferência por filmes de conteúdos extremos, mostrou o seguinte: as personagens dos filmes seriam tão horríveis e cruéis que tal maldade superaria em tudo a da vida real. Dessa maneira, seria mais fácil suportar os pais e professores.


As cenas de violência podem ser, para o espectador, o único meio de vivenciar algo. Muitas almas se encontram em tal amortecimento - causado, em grande parte, pela influência da mídia - que no decorrer da vida real raramente vivenciam algo significativo. Assim, surge uma fome de vivências, saciada momentaneamente pela visão de cenas violentas.

Uma última razão precisa ser mencionada. Ela é, com certeza, a mais surpreendente. Eu gostaria de apresentá-la como uma suposição, apesar de estar baseada numa experiência pessoal. Há alguns anos, organizei com colegas da Universidade de Bremen uma série de eventos sobre o tema 'violência na tela'. Como preparação, emprestamos da midiateca do Arquivo Regional uma 'mala vermelha'. Esta continha vídeos mostrando cenas de extrema violência, para oferecermos aos professores uma ideia do que alguns alunos assistem.

Eu só assisti a uma pequena parte dos filmes. O efeito disso, contudo, pode ser sentido claramente. Por muitos dias, todas as ações meditativas fracassavam já de início. Eu tinha a impressão de estar usando um chapéu de ferro, que resistia a todas as tentativas de transcender o plano puramente terrestre. Em outra ocasião posterior, essa experiência se repetiu.
Uma das obras mais famosas de Michelangelo, 'A criação de
Adão', retrata a ligação do mundo da matéria com o mundo
espiritual. Mas este fenômeno é interrompido quando o

ser humano se expõe a determinados conteúdos

Eu gostaria de relacionar esse fenômeno observado por mim com outro fator. Atualmente, há muitas pessoas - entre as mais jovens, o número provavelmente aumenta - possuidoras de qualidades anímicas que lhes permitem uma percepção mais ou menos clara de que, para além dos sentidos, há um universo movido por forças e seres espirituais. A humanidade atual sente saudade de entrar em contato com esse plano espiritual. Ao mesmo tempo, há um temor profundo das experiências e tarefas que nos esperam para além dos limites sensoriais. Rudolf Steiner observa o seguinte: alguns dos nossos contemporâneos que defendem veementemente a posição do materialismo fazem-no somente por não possuírem a consciência de terem medo do mundo espiritual. Considero a possibilidade de esse medo ser um dos motivos que levam muitos a se expor a cenas de violência. Elas constroem um muro entre o mundo espiritual e o material.

Lancemos agora um olhar sobre um aspecto ainda não mencionado do efeito da violência cênica. Dissemos acima que tais cenas são consumidas para desviar do próprio medo, de modo a surgir a impressão de que nada daquilo nos diz respeito. Esse alívio, entretanto, acontece somente durante o assistir das cenas violentas, e seu preço é o aumento do medo ao final da exibição. Esse efeito pode ser claramente comprovado junto a espectadores de tevê. Está provado que os que assistem muita à televisão (mais de 3 horas por dia) tendem a estender os parâmetros do mundo midiático - por exemplo, a frequência e também, com isso, o da probabilidade de assassinatos e outros crimes - à sua realidade cotidiana. A consequência é que essas pessoas se sentem mais ameaçadas do que as outras. Esses espectadores intensivos procuram proteger-se mais frequentemente do que os outros por meio de câmeras ocultas, fechaduras especiais contra arrobamentos e armas. Cenas de violência aumentam não só a prontidão para agir violentamente como leva, ainda, a considerar que as outras pessoas estariam mais prontas a fazê-lo do que em verdade ocorre".

Heinz Buddemeier, Mídia e violência, Ed. Antroposófica, páginas 38, 39, 40 e 41

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